terça-feira, 6 de agosto de 2013

"A Mística Feminina" - 50 anos e Betty Friedan - autora

"Mística Feminina" - os 50 anos do  livro da escritora Betty Friedan: a feminista que estremeceu a América e o Ocidente
A publicação de “A Mística Feminina”, em 1963, causou um enorme impacto na sociedade norte-americana, abalando os padrões patriarcais e consumistas, rejeitando o casamento e maternidade como formas únicas de existência da mulher, inaugurando um novo estádio no Feminismo do Ocidente.

O livro, que se tornou best seller’ nos Estados Unidos, publicado em 1963, discutia a crise de identidade feminina, analisando minuciosamente a construção da imagem da mulher como dona de casa perfeita, mãe e esposa. Tornou-se um dos principais desencadeadores da chamada segunda onda feminista que varreu o Ocidente.

Conhecida por remodelar as atitudes dos americanos em relação à vida e os direitos das mulheres, Betty Naomi Goldstein, mais conhecida como Betty Friedan, foi uma importante ativista feminista estado-unidense do século XX. Participou também de movimentos marxistas e judaicos. 
Curiosamente, morreu no dia de seu 85º aniversário, em sua casa em Washington. De acordo com a porta-voz da família, a causa da morte foi falência cardíaca congestiva.
Nasceu em 04/02/1921 e faleceu em 04/02/2006.

Publicou o livro "The Feminine Mystique"/1963 ("A Mística Feminina"), best-seller que fomentou a segunda onda do feminismo, abordando o papel da mulher na indústria e na função de dona-de-casa e suas implicações tanto para a sobrevivência do capitalismo quanto para a situação de desespero e depressão que grande parte das mulheres submetidas a esse regime sofriam.

Foi também co-fundadora da Organização Nacional das Mulheres, nos Estados Unidos, juntamente com Pauli Murray e Bernard Nathanson, e auxiliou também na criação do NARAL, organização de fomento aos direitos reprodutivos, inclusive o do aborto. É considerada uma das feministas mais influentes do século XX.
“Uma boa mulher é a que ama apaixonadamente, tem energia, seriedade, convicções apaixonadas, assume responsabilidades e modela a sociedade.” Betty Friedan

Uma manifestação emblemática organizada pelo movimento em 26 de agosto de 1970, em várias cidades americanas, mostrou àquela sociedade a dimensão do que estava sendo gestado. Milhares de mulheres foram às ruas em Nova York, Washington, Boston, Detroit e várias outras cidades do país. Não estavam unidas como estudantes, operárias, esposas de grevistas ou de empregados, nem como mães de soldados, mas simplesmente como mulheres. E essa era a grande novidade.
A passeata foi o ápice de uma série de reuniões, conferências, atos de protestos, mensagens ao Congresso e outras formas de ação tendentes a conscientizar as mulheres e despertar a atenção do público e dos legisladores sobre importantes questões vinculadas à posição da mulher naquele momento. Quatro pontos básicos eram pleiteados por elas: oportunidades iguais de acesso ao trabalho e à instrução, paridade de salários para tarefas iguais, legalização do aborto, abertura de creches em regime de tempo integral em todo o país.

Assim como em outros momentos protagonizados pelas feministas, a passeata foi alvo de uma onda de sarcasmo. A imprensa fez de tudo para desqualificá-la pela ironia e pelo ridículo, mostrando-a como uma colossal manifestação de histeria coletiva. Betty Friedan e outras líderes do movimento foram descritas como frustradas, neuróticas, homossexuais, megeras ressentidas, espumando de ódio contra o sexo masculino.

A militância feminista de Betty Friedan a marcou para a vida inteira e influenciou os estudos sobre gênero e mulheres nas universidades americanas.
Betty Friedan na Mística Feminina -

N’ A Mística Feminina, Betty Friedan lamenta o escárnio e o infindável catálogo de deturpações que restringem o movimento feminista e impedem o reconhecimento do seu contributo para a consecução do progresso humano.

“Por perversão da história, acredita-se que o entusiasmo e o ímpeto do movimento feminista nasceram do ódio ao homem, nutrido por solteironas amargas, esfomeadas de sexo, castradoras, assexuadas, que se consumiam em inveja tão profunda do órgão masculino que desejavam arrebatá-lo, destruí-lo, exigindo direitos apenas porque não tinham capacidade de amar como mulher”. Este pensamento errôneo teria conseguido descredibilizar a luta feminista? Betty Friedan nos responde:
“O mito de que as feministas eram “monstros antinaturais” baseava-se na crença de que destruir a submissão da mulher, ordenada por Deus, seria destruir o lar e escravizar os homens”. E, para contrariar juízos perversos, “as feministas precisavam de lutar contra a concepção de que estavam a violar a natureza que lhes fora doada por Deus”. O seu propósito fundamental consistia em “provar que a mulher era humana. Antes de começarem a combater pelo direito de igualdade com o homem, precisavam despedaçar, se necessário com violência, a estatueta de porcelana que representava a mulher ideal do século passado. Precisavam provar que ela não era um espelho vazio, passivo, uma decoração inútil, um animal sem inteligência, um objeto a ser usado, incapaz de interferir no próprio destino”.

Assim, “o feminismo não foi um mau gracejo. A revolução feminista precisava ser empreendida porque a mulher ficou simplesmente detida num estágio de evolução muito aquém da sua capacidade humana”.

E ainda, depois de tudo isto, “será difícil compreender que a emancipação, o direito a ser totalmente humana fosse tão importante para várias gerações de mulheres que algumas chegassem a lutar com os próprios punhos, fossem encarceradas, ou até morressem pela causa?”

Betty Friedan, a escritora de “Mítica Feminina” no Brasil com Rose  Marrie Muraro

“Mística feminina” passou a ser usado como verdadeira Bíblia pelo movimento de mulheres americanas. A polêmica trazida por esse livro tinha espraiado reflexos pela Europa e também chegou ao Brasil, primeiro através da imprensa, e depois com a publicação do próprio livro, em 1971, no país, pela ousadia de Rose Marie Muraro, que à época estava à frente da Editora Vozes, no Rio de Janeiro. Na orelha da primeira edição brasileira, a apresentação dizia que aquele havia sido o primeiro livro a denunciar a manipulação da mulher pela sociedade de consumo.
No mesmo ano, Betty foi trazida ao Brasil pela editora para o lançamento da obra. Como a própria Rose Marie Muraro escreveria, anos depois, em sua autobiografia Memórias de uma mulher impossível,3 não era fácil ser feminista no Brasil daquela época. Ela própria, feminista assumida e atuante, era constantemente malhada e ridicularizada pela imprensa. Foi chamada de lésbica e feia pelo colunista Ibrahim Sued, sofreu com a turma do Pasquim, mas acabou se saindo bem em uma entrevista realizada ainda naquele ano pelo jornal nanico.
Sem cobrar cachê, viajando apenas com as despesas pagas, como conta Muraro, Betty veio para um lançamento duplo no país: no Museu de Arte Moderna, no Rio de Janeiro, e na Biblioteca Municipal Mário de Andrade, em São Paulo.
Logo que chegou ao Rio, foi levada por Rose para ser entrevistada por Millôr Fernandes e seus asseclas, sabidamente antifeministas, no Pasquim. Provocada durante toda a entrevista, ela se irritou e "deu uma cacetada no gravador que foi parar longe", nas palavras da própria Rose.
Finda a troca de farpas, entrevistada e entrevistadores acabaram se entendendo. O número 94 do jornal, em que foi publicada sua entrevista, trazia a seguinte frase de capa: "Desculpe Dona Betty, mas nós vamos dar cobertura às furadoras da greve de sexo". Na edição, o jornalista Paulo Francis, o mesmo que havia iniciado a entrevista perguntando a ela se tinha vindo ao Brasil para dar fim à "submissão secular da mulher brasileira", declararia que eles haviam gostado dela, que "foi muito estimulante o papo com Betty Friedan".
A peregrinação por outros jornais do Rio e de São Paulo continuou. Muraro diz que até no cabeleireiro o Jornal do Brasil veio lhe entrevistar:
[...] Demos uma entrevista coletiva no Rio de Janeiro, outra em São Paulo, e fomos a todas as televisões, durante três dias... Os jornais nos davam páginas centrais.
No Rio, a entrevista foi no Copacabana Palace, e em São Paulo, na Biblioteca Mário de Andrade. O lançamento estava cheio. Um espaço lindo que o Jair Canizela, gerente da Vozes em São Paulo, arranjou. A mídia toda estava ativada. A Veja fez uma matéria enorme comigo e com a Heloneida, deu páginas amarelas para a Betty. E o livro não vendeu essas coisas porque ainda era muito assustador.
Uma movimentada agenda complementaria sua estada no Brasil. Conheceu as mulheres que marcharam em 64, pela família, Deus e a propriedade, visitou favelas, onde conheceria avós de 32 anos e mulheres que sustentavam suas famílias sozinhas, fazendo com que ela logo as relacionasse com as moradoras de comunidades negras americanas. Conheceu torturados, almoçou com grandes empresários da área da comunicação como Roberto Civita (Grupo Abril) e Adolpho Bloch (Bloch Editores). Deste último, tornou-se amiga ao descobrir que as famílias eram do mesmo lugar da Ucrânia.
Rose Muraro relata ainda que Friedan teria se queixado da própria Rose por ter feito pouco caso dela durante a entrevista ao Pasquim. Rose se justificou dizendo ter apenas lhe alertado de que eram os jornalistas que estavam ridicularizando o feminismo. A brasileira, por sua vez, reclamou de Friedan por ter falado tão mal dos militares, o que acabaria repercutindo depois da volta da escritora aos Estados Unidos, já que Rose seria vigiada por eles durante seis meses. Do impasse, Muraro iria se inspirar na imensa coragem de fazer o que tinha de ser feito, a partir da luta daquela americana corajosa. Keep doing (vá fazendo) passou a ser sua palavra de ordem.
Insatisfeita com o que chamou de fatos distorcidos pela imprensa na época, a jornalista e psicanalista Carmen da Silva manifestou nas páginas de sua seção A Arte de Ser Mulher, na revista Claudia, seu protesto pelo preconceito da imprensa brasileira contra Betty Friedan:
Durante essa visita verifiquei, por mim mesma, que nem sempre se pode dar crédito ao noticiário. Friedan dizia uma coisa e os meios de comunicação "reproduziam" outra completamente diferente. Cansei-me de ouvi-la expressar com mediana clareza idéias que logo apareciam truncadas e deformadas; vi como lhe foram atribuídos, sem cerimônia e contraditados com a maior suficiência, conceitos que ela jamais emitiu. Isso, sem falar nas perguntas primaríssimas que foram dirigidas a uma mulher com formação universitária, nos grosseiros ataques a uma hóspeda cortês e nas suposições gratuitas sobre sua vida íntima.
No mesmo artigo, Carmen da Silva resolve resenhar o livro de Friedan como forma de reparar a "falsificação" dos pontos de vista da autora norte-americana feita por seus "detratores".
O texto de três páginas frisa o esforço intelectual e de pesquisa de Betty Friedan empreendido na coleta e análise de informações para a composição de seu livro. As entrevistas feitas com centenas de mulheres, médicos, cientistas, educadores, redatores de temas femininos, centros de saúde mental e de orientação familiar, além da leitura das publicações escritas nos últimos 20 anos a respeito da mulher, estão devidamente documentadas por Carmen da Silva, que reforça as posições da norte-americana:

Como porta-voz do Movimento de Libertação Feminina, opina Betty Friedan – e eu endosso sem reservas – que não é possível modificar o atual panorama de violência no mundo sem o concurso da mulher, que além de constituir metade do gênero humano, forma ou deforma a outra metade. Não se trata de opor-se ao homem, mas sim de que ambos, homens e mulheres, tomem consciência de sua alienação, de sua manipulação pela sociedade de consumo que os impedem de crescerem e se realizarem juntos como seres humanos ativos, felizes, úteis. Trata-se de aliar energias na tarefa de criar um mundo melhor. Trata-se de possibilitar entre eles um vínculo realmente maduro e harmonioso, em que nenhum domina o outro ou usurpa algo do outro.

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